Por Rosângela Espinossi
Estreou esta semana “Jackie”, com Natalie Portman, que retrata os dias que sucederam o assassinato de seu marido, o então presidente John Kennedy, em 22 de novembro de 1963. O filme teve três indicações ao Oscar: melhor atriz, melhor trilha sonora e melhor figurino. Neste quesito, é um dos mais fortes concorrentes, ao lado de “La La Land: Cantando Estações”, “Aliados”, “Florence: Quem é Esta Mulher?”, e “Animais Fantásticos e Onde Habitam”. Entre as peças, muitas delas réplicas de vestidos originais usados pela ex-primeira-dama, não vai passar em branco o icônico tailleur rosa, com lapela azul-marinho, que vestia quando o marido foi baleado.
Hoje guardada sob refrigeração no Arquivo Nacional, em Washington, a peça original, ainda suja de sangue, assim como as meias, os calçados e camisa, só poderá ser vista pelo público em 2103, por ordens da família. Tal conjuntinho já havia sido usado em seis ocasiões anteriores. Sim, ela repetia looks. Se fosse hoje, o fato seria assunto para posts, inclusive aqui no “Elas No Tapete Vermelho”. O detalhe, porém, é que as duas peças, sempre tidas como originais Chanel, não o eram. Sim, ela também mandava fazer cópias de peças de grifes famosas.
Mas, calma, não foi uma coisa do outro mundo. A cópia, ao que parece, foi autorizada pela própria Maison Chanel. E como a estilista ainda estava viva e nada passava sem seu crivo, arrisco-me a dizer que foi a própria Coco Chanel quem deu o aval à casa americana Chez Ninon, a produzi-la. Justine Picardie, autora do livro Chanel, Her Life, confirma que a confecção foi autorizada pela maison francesa, que forneceu o tecido e os botões para a Chez Ninon. O ateliê americano produziu grande parte das roupas usadas por Jackie.
A primeira-dama assim o fazia para não ser acusada de gastar dinheiro com grifes estrangeiras. Seu estilista de coração era o francês naturalizado americano Oleg Cassini. “As roupas não eram falsas ou pirateadas, mas sim feitas por encomenda usando materiais fornecidos pela Chanel, em Paris.” escreveu Picardie no livro. Em 2012, porém, Karl Lagerfeld disse que o tailleur não tinha o aval da casa. “Era falso, uma cópia linha por linha feita por Cassini. Jacqueline teve verdadeiros Chanel, encomendados pela sua irmã. Temos todas as provas.”, afirmou Lagerfeld.
Polêmicas à parte, o tailleur “tipo Chanel” é uma das peças mais emblemáticas do filme. E mesmo com a afirmação de Lagerfeld, a Chanel atual ajudou Melanie Fontaine a produzir os cinco exemplares usados nas filmagens, cedendo botões e ajudando na escolha dos tecidos. A figurinista disse ao site AnOtherMag: “Foi um grande desafio. Teríamos que chegar o mais perto possível da memória coletiva que as pessoas têm de Jackie, que foi muito bem documentada pela mídia. Isso foi muito importante para acertar na emoção e ajudar Natalie a encontrar a personagem. O grande teste foi a prova do conjunto pink da Chanel. Ficou realmente convincente”, afirmou.
Todo o filme, porém, é um desfile pelos guarda-roupa da ex-primeira-dama, que angariou milhões de fãs nos Estados Unidos e no mundo, levando milhares de pessoas a vê-la em suas viagens ao lado do marido. Essa imagem a seguiu pelo resto da vida, tanto que quando se casou com o armador grego Aristóteles Onassis, o vestido Valentino que usou durante a cerimônia causou frisson. Logo depois das fotos serem publicadas mundo afora, a casa italiana recebeu mais de 60 pedidos nos dias que se seguiram ao matrimônio, em 1968.
Jackie sabia que sua imagem dizia muito mais do que mil palavras. E nunca foi pega desprevenida no quesito vestuário nem mesmo enquanto ocupou a Casa Branca (está certo que quando casada com Onassis, foi flagrada tomando sol de topless numa ilha grega). A película dirigida por Pablo Larraín é impecável neste quesito. O trabalho de Melanie Fontaine, cujo ateliê fica em Paris, prima por reproduzir quase tal e qual as peças usadas por Jacqueline Bouvier Kennedy.
Há vestidos vermelhos, pretos e muito mais. Natalie Portman aparece até mesmo com uma camisola preta, com rendas no colo e na barra, hoje usada como roupa para sair, dentro da tendência slip dress (algo como vestido de dormir, que podemos traduzir como camisola). De acordo com a figurinista, apenas um vestido foi livre criação dela e de sua equipe, inspirados no estilo próprio de Jacqueline na vida real. Trata-se da peça verde, usada durante jantar oferecido ao violoncelista Pablo Casals. O modelo foi complementado por luvas brancas.
Claro que foco do filme são os momentos de agonia que Jackie viveu após a morte do marido, mas não tem como tirar a importância do “falso” tailleur Chanel rosa nesse momento. Na viagem de volta a Washington, ela se recusou a trocar de roupa: “Que vejam o que fizeram”, ao se referir às manchas de sangue. Todos vimos e o tailleur se transformou numa peça de resistência e numa demonstração de força dessa mulher.