O terceiro dia da 58ª edição do São Paulo Fashion Week (SPFW)mostrou que o Brasil, e principalmente o Nordeste e o Norte, sabe e sabe muito fazer moda chique, elegante, com tradicionais trabalhos feitos à mão, com cortes impecáveis e com tendências globais.
Weider Silveiro, Meninos Rei, Gefferson Villa Nova, Foz e Normando provaram toda a versatilidade e savoir-faire brasileiro, com sustentabilidade, preocupação social e ambiental. Teve ainda as sobreposições exageradas e coloridas de Tom Martins, seguindo seu estilo urbano, com um pé em Matrix e no psicodelismo dos anos 1960 e 1970. E por fim, a Bold Strap, que apostou em seu fetiche raiz, agora também incluído no cotidiano, à luz do dia, para quem não se importa de mostrar muita pele no dia a dia.
Tudo isso recheado com a presença maciça de famosas na passarela, como Deborah Secco, Camila Queiroz, Lore Improta, Cris Vianna, Sheila Mello, Icaro Silva, Thalma de Freitas, além da estreia dos filhos gêmeos de Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert como modelos.
Veja resumo do que cada grife apresentou
Weider Silveiro
Nada do que faz Weider Silverio é óbvio ou caricato. O estilista, que abriu o terceiro dia do SPFW, no shopping Iguatemi, continua a beber da fonte de sua terra natal, o Piauí. Em áudio emocionante antes do desfile, em que fala das dificuldades de se viver numa região pobre, em que o “adolescente e jovem dos anos 1980 e 1990” só queriam buscar outras alternativas saindo de lá, finalizou dizendo que o “Nordeste é o único lugar possível”.
E esse lugar possível foi traduzido a partir das inspirações das festas populares, como o reizado, maracatu, festas de São João e do pau-de-fitas, em uma coleção chique, minimalista para usar em qualquer parte do mundo.
Suas memórias de infância surgiram nos volumes das saias e calças, algumas balonês, em modelagem corset nos dorsos, nas cinturas dos vestidos mais baixas, como o vestido desfilado por Talma de Freitas, e nas fitas aplicadas nas roupas, ampliando com moderação e elegância peças em tons de terra, amarelas mais fortes ou mais claras, como o manteiga, azul-clarinho.
Tecidos como a renda de bilro, feita por rendeiras da Praia do Iguape, em Aquiraz, no Ceará, deram o tom ainda mais sensual à coleção, com tramas abertas e transparência explícita. O trabalho foi usado também nas fitas, que faziam referência às festas de São João. Nas estampas, malhas xadrezes destinadas antes a serem usadas como forro, o que conferiu leveza ao looks.
Meninos Rei
Os irmãos Céu e Junior Rocha, da Meninos Rei, fizeram uma celebração à baianidade e às suas memórias afetivas, com a coleção “Suco de Axé”, palavra que, no candomblé, significa “energia vital”, além de reverenciar os 40 anos da axé music, com trilha sonora para lá de dançante e emocionante. Tanto que abriu com tambor baiano, fazendo coreografia com o público, e incluindo músicas que fizeram a alegria de muitas gerações com suas letras maliciosas, como “É o Tchan”.
Uma infinidade de looks com os tecidos africanos, típicos da marca, além de estampas próprias do estilista, também multicoloridas, com peças volumosas, seguindo tanto o estilo da marca quanto as tendências atuais, como volumes balonês, sobreposições, mangas bufantes e recortes. E, pela primeira vez, looks brancos, reverenciando os orixás do candomblé. Desfile também inclusivo, com pessoas mais velhas, cadeirante e de várias silhuetas.
Gefferson Vila Nova
Gefferson Vila Nova levou para o SPFW sua alfaiataria com sabor de mar. O baiano, no entanto, buscou inspiração em outros mares. Na Costa Amalfitana, na Itália, mas fez o que sabe fazer táo bem: uma moda masculina perfeita e descomplicada, que mustura ternos laraguinhos e bermudas com trench coats. Nas cores, o amarelo-manteiga (ou creme) vem na combinação do momento: com preto. Nas estampas, imagens de limões sicilianos e da de sereia, inspirada na mitologia grega e na Gruta Azul da Ilha de Capri.
Foz
Mais um representante do Nordeste na passarela paulista. A Foz, de Antônio Castro, mostrou a coleção coleção “O Conto de Laura”, que fala da história da tia-avó do estilista, que fugiu da casa dos pais para se juntar ao cangaço nos anos 1930. Em tons que variam do claro, passando por marrons e preto, o alagoano apostou nas técnicas artesanais como fuxico, renda filé e cestarias.
Normando
O gêmeos João e Francisco, de 16 anos, estrearam na carreira de modelo na passarela da grife paraense Normando, também novata no SPFW. Os filhos de Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert entraram em dupla, com looks em preto e branco invertidos: calça branca e camisa preta e vice-versa. Mas a coleção da Normando, de Emídio Contente e Marco Normando, vai além disso.
A dupla trabalha com fibras de juta, algodão e malva, de origem brasileira, cultivadas nos estados do Pará e de Rondônia, de forma sustentável, além de peças feitas com látex e tecidos sustentáveis do Norte do Brasil.
O tema da coleção é “Vândalos do Apocalipse”, fazendo alusões as modernistas que, no início do século XX, viviam no Norte do país e se reunião no Mercado Ver-o-Peso, como da chamada academia Peixe Frito, daí estampas, bolsas e frases fazendo alusão a peixes. A camisa de smoking com o jabô cruzado, lembrava, por exemplo, rabo de peixe.
Martins
A Martins levou sua roupa ampla, sobreposta e muito colorida para seu inverno 2025, com inspiração no filme Matrix (1999) e no movimento hippie, com sua vibe psicodélica, com flores e xadrezes. Aa estampas de coelhos sobre circuitos verdes de computador (primeira foto à esquerda) faziam referência ao filme.
O estilista nunca foi minimalista e dessa vez maximizou ainda mais essa estética, com as camadas de roupas amplas, em looks agêneros. As cores vivas pontuavam estampas e flores artesanais se transformavam em coletes e blusas, usados com peças amplas feitas com patchwork de tecidos.
Os jeans com tiras e etiquetas com o nome da marca aplicados também apareceram ao lado de tecidos planos e ponchos de lã. O estilista Tom Martins também entrou na onda do balonê, como no vestido de corte mullet desfilado por Vivi Orth.
Bold Strap
Camila Queiroz desfilou mais uma vez com looks sensuais para a grife Bold Strap, que revisitou suas raízes, levando à passarela do SPFW suas peças de látex e couro, ideais para práticas explícitas em que o corpo é o ator principal, com um ar fetichista urbano.
Entre a primeira e a última entrada dela, dezenas de modelos mostravam a essência da marca, com transparência do látex, tule e seda, lembrando segunda pele, alguns com tiras de cinta-ligas amarradas, outros com os chamados harness (peça de tiras de couros que envolve o dorso, usadas em geral em práticas sadomasoquistas, mas que estão cada vez mais incorporadas em looks urbanos, incorporadas aos tecidos).
Recortes, transparências masculinas e femininas, pele à mostra e muita sensualidade marcaram a passarela da marca.