O sexto dia da 58ª edição do São Paulo Fashion Week (SPFW) teve oito apresentações, em que os trabalhos manuais, seja crochê, flores feitras à mão, tricô deram as caras. A inclusão, com modelos trans, plus size e mais velhos também marcaram presença. Mas homenagens a personagens e autores de histórias em quadrinhos, chamaram a atenção.
O estilista Rafael Caetano celebrou Mauricio de Souza, criador da Turma da Mônica, que completa 90 anos em 2025 (ele fará 89 anos no próximo dia 27 de outubro) foi um deles. E a grife carioca The Paradise comemorou os 90 anos de Pato Donald, com um desfile alegre e cheio de energia. Na passarela, os gêmeos João e Francisco, ao lado da mãe Fernanda Lima, além de outro napobaby, Pietro, filho de Giovanna Antonelli e Murilo Benicio.
Ângela Brito
A coleção da estilista Angela Brito foi batizada de “Criola”, trazendo a força das miscelâneas culturais, com a origem em comum das múltiplas culturas que formam o Brasil, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe.
Os looks contam com técnicas manuais, como redendê (bordado do Nordeste do Brasil), pánu di terá (pano de tear caboverdiano) e capitonê. Destaque para tons terrosos, contrastando com verde, azul e amarelo.
Lucas Leão
O estilista carioca Lucas Leão se inspirou nos famosos bate-bolas (ou clovis), fantasias carnavalescas do subúrbio carioca e nas vitrines das lojas de noiva dessa mesma região. Antes de ver a coleção, a impressão que dá é que o desfile virá cheio de alegorias e vestidos bolo de noiva. Ledo engano.
O estilista, que vem de uma família de alfaiates, apresentou um desfile limpo, com roupas masculinas bem construídas, mas que fogem do óbvio. Leia-se: paletós com aberturas atrás, babados sobrepostos sob essas vestes masculinas, cinturas altas com cintos usados abaixo do cós. Tricôs com nós inesperados, crochês perfeitos, tons que vão do branco ao amarelo-manteiga, azuis e rosas pálidos.
Mas e as noivas? Elas bem desconstruídas em detalhes, como regatas, saias curtas e mangas arredondadas, de forma orgânica, mas todas essas peças com flores de tule aplicadas. Foram mais de 3 mil flores usadas no desfile, criando peças volumosas e delicadas ao mesmo tempo.
Rafael Caetano
Quando se pensa em desfile sobre Maurício de Sousa, roupas que fazem referência a Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali vêm a cabeça. Rafael Caetano saiu do lugar-comum e se inspirou mesmo no criador da Turma da Mônica.
Rafael Caetano usou apenas dois personagens do cartunista: Horácio, desenhado em traço de giz sobre fundo preto, lembrando quadro negro. E o coelhinho Sansão, mas apenas com suas orelhas, que se transformavam em estampas. E se você pensou que eram azuis, errou. O estilista usou verde, como Horácio, um alter ego do próprio Maurício.
A roupa masculina impecável de Caetano veio com camisas que fogem do comum, que podem ser usadas com um xale por cima, como no look de Klebber Toledo, com a estampa de orelhas. Conjuntos de calça e camisas, bermudas, túnicas e calças com pregas nas barras.
Destaque para a risca de giz que se formava a partir de linhas com a conhecida assinatura de Maurício de Souza. Os looks finais de marinheiro foram inspirados numa antiga foto do desenhista em baile de Carnaval quando era criança. PS.: os modelos desfilavam em volta de vários gibis desfolhados espalhados pelo chão.
Silvério
O estilista Rafael Silvério apresentou seu streetwear enxuto, trabalhado na alfaiataria bem construída, em tons de preto, branco e rosa. A coleção se chama Eros, que tem como ponto de partida o livro “Agonia de Eros”, de Byung – Chul Han, com uma visão crítica e pessimista de que o amor morre com a evolução tecnológica.
Na passarela, muita informação de moda nas camisas brancas nada óbvias, nos vestidos curtos lisos, apenas com uma pequena faixa como enfeite, nos moletons, nos jeans com sobrepano na frente, nos blazers usados sem camisas, criando uma abertura geométrica. A coleção “Eros” Também tem referência ao termo italiano “Sprezzatura”, que significa o ato de aparentar indiferença e facilidade ao realizar ações difíceis.
Santa Resistência
Mônica Sampaio, criadora da Santa Resistência, nunca pisou na África, mas após fazer teste de DNA, se reconectou com as tribos Maasai do Quênia e da Tanzânia, de onde vem sua ancestralidade. Esse “retorno” às origens deu forma à coleção “Manifesto Ancestral”, mostrada neste sábado no Pavilhão das Culturas Brasileiras, no Ibirapuera.
Com casting 100% preto, a apresentação foi aberta com um manto massai, criado pelo artista visual Alex Rocca, e deu o tom do que viria, com as cores roxa e vermelha, em padronagem quadriculada. A estampa e as cores permearam as roupas, feitas com materiais produzidos de forma sustentável em algodão, seda de algodão, linho e tafetá. O crochê não faltou no desfile.
Os tons de roxo e vermelho foram substituídos também pelo verde-água e azul-mar, em vestidos fluídos, drapeados e franzidos, com volumes nos ombros ou nos quadris. O preto também compôs alguns looks, inclusive masculinos.
The Paradise
A grife The Paradise, de Thomaz Azulay e Patrick Doering, fez uma festa no São Paulo Fashion Week, num tributo aos 90 anos do Pato Donald. Uma fada madrinha abriu o desfile, a modelo Veluma, de 61 anos, com peruca rosa e varinha. E quem puxou a fila de looks foi Fernanda Lima, seguida pelos filhos gêmeos, João e Francisco. Pietro, filho de Giovanna Antonelli e Murilo Benício (à direita na foto), também também estreou na passarela.
A marca carioca sempre esquenta os desfiles, com alegria, cor e estampas. Não foi diferente. E, claro, a dupla de estilistas colocou Pato Donald conversando com Zé Carioca, em estampas estilizadas do calçadão de Copacabana.
Maxi estampas do pato da Disney e do papagaio Zé Carioca coloriam looks inteiros. Em versões menores, apareciam em peças como camisas e bermudas. Mas não só eles: Mickey, Minnie, Tio Patinhas, Cinderela, Princesa Aurora.
A vibe carioca presente nas roupas leves e despojadas se estendia aos acessórios, como bolsas de formato orgânico e sandálias Havaianas, algumas customizadas com saltos altíssimos. A The Paradise também fez saias e vestidos com minichinelinhos de dedo, com movimento e bossa. Claro que no final o personagem principal não podia faltar. Pato Donald e Margarida passaram pela passarela alegrando ainda mais a festa.
Led
A LED, do mineiro Celso Dias, sempre traz uma mensagem política em seus desfiles. Dessa vez, veio em forma de alegria, com uma trilha sonora de “piseira”, para apresentar a coleção “Gambiarra”, que a marca explicou como o Grande Artifício da Mecânica Brasileira Inventada para Arrumar, Recuperar ou Realizar Algo.
Na verdade, a coleção veio para falar da resiliência do brasileiro em resistir, sobreviver e ainda ter tempo para ser feliz. Daí a trilha sonora alegre, que fez modelos como Vivi Orth, a atriz Patty Dejesus, Gianne Albertoni e Barbara Fialho dançarem na passarela.
Claro que não faltou o crochê, que faz parte do DNA da marca, além das peças de tecidos planos, como linho e jeans, algumas com fios pendurados mostrando que o inacabado (gambiarra) pode dar certo. Nos acessórios, clipes, mosquetões e argolas davam ainda mais voz à ideia da coleção.
Isaac Silva
Não é a primeira vez e nem será a última. E essa é uma ótima notícia. Afinal, a inclusão da moda escancarou as portas da moda e a estilista trans Isa Silva, da marca Isaac Silva (seu nome antes da transição), mantém a filosofia de inclusão da comunidade LGBTQIA+ em suas apresentações no SPFW.
Na noite deste sábado (19), não foi diferente, tanto que a maioria de seu casting era composto por pessoas trans, algumas participantes do programa “Born To Fashion”, da qual é jurada e que está no ar no canal E!, com novos episódios todas as quintas-feiras, até dua 14 de novembro.
O desfile da coleção “Celebrações”, dando inicio às comemorações de 10 anos da marca, começou com a apresentação da performer trans Tasha Kaiala, perguntando para o público quem tinha axé. O mote “Acredite no seu Axé” é marca registrada da grife da estilista baiana e que estava escrito em algumas de suas jaquetas jeans. No final, uma performance de bater cabelo com a veterana Marcia Pantera.
No quesito moda, Isa Silva mostrou seu talento em peças de crochê, trabalho manual recorrente nas passarelas do SPFW. Uma das que desfilaram com vestido feito com a técnica foi a ex-BBB Isabelle Nogueira, a segunda a entrar, após duas modelos negras vestidas iguais, também com crochê dourado, com touca que cobria o rosto, criando uma potente imagem fashion.
Túnicas, assimetria, vestidos, blusas, saias, tops dourados vieram na sequência, vestindo todos os corpos e gêneros. Teve ainda o bloco de brancos e pretos, em modelos mais esportivos, incluindo macacões e jaquetas, algumas com aplicações de brilho. Túnicas leves também permearam a coleção, para todos os corpos, idades e mentalidades. Axé.