A modelo e atriz Mayara Russi, 31 anos, mãe solo com dois filhos, rompe barreiras na vida e na TV. É a primeira mulher plus size a fazer uma transmissão no tapete vermelho do Canal E! mundial, mostra as batalhas e as conquistas das mulheres gordas no programa “Beleza GG”, do mesmo canal, ao lado de Flúvia Lacerda, Nahuane Drumond e Elisa Fava. Não bastasse isso, foi escolhida para viver Vitória, top plus size bem-sucedida na segunda versão de “Verdades Secretas”, da Globo. “As gravações ainda não começaram, mas devem acontecer dentro de todos os protocolos sanitários. Farei teste em São Paulo, quando sair, e no Rio, quando chegar”, disse.
Na carreira desde os 15 anos, quando resolveu trabalhar para ganhar seu próprio dinheiro, Mayara contou ao “Elas no Tapete Vermelho”, em entrevista exclusiva, como é conviver com preconceito, com a gordofobia e deu conselhos para as mulheres gordas. “Me sinto uma mulher foda”, afirmou.
“As pessoas têm um certo medo de falar a palavra gorda, porque muitas já se sentiram ofendidas. Tentam também minimizar, falando no diminutivo, gordinha. Ou usando outras palavras, como forte, grande. É preciso normalizar a palavra gorda como um adjetivo, como bonita, feia, alta, magra, morena, loira, careca”, afirmou.
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Confira abaixo trechos da entrevista e vídeo exclusivo que que ela gravou para o “Elas no Tapete Vermelho!
Beleza GG
“A primeira temporada do programa “Beleza GG”, do Canal E!, veio com uma incógnita para mim. É um programa de um canal que sempre deu muita ênfase à beleza, ao glamour. Por uma grata surpresa, foi um sucesso, as pessoas gostaram muito. É muito importante ser reconhecida e ter essa representatividade num canal assistido por pessoas que podem ter a cabeça dentro da caixinha. Representa uma quebra de padrão muito importante para mim. A segunda temporada também está sendo maravilhosa. As pessoas estão se identificando e se libertando também desses estigmas e padrões que uma vez alguém inventou que teria de ser.”
Diversidade
“Na verdade, há diversidade em tudo quanto é canto do mundo. A gente precisa expor que ser diverso é ser normal. Precisa respeitar. Ninguém é obrigado a gostar de nada, mas o respeito é a base de tudo. A gente quer passar no “Beleza GG” que nem tudo são flores, passamos muitos perrengues. Muita gente acha que a vida de modelo é fácil, mas não é. Há muitos desafios, perrengues e superação. Mas também tem a parte do glamour, que acaba sendo a recompensa no final.”
América Latina
“O retorno que estamos tendo em outros países da América Latina é mais do que o esperado. Estou estudando espanhol para me comunicar melhor. Vejo o Brasil com um passo a frente em relação a outros países. Temos mais acesso, principalmente em relação ao vestuário do que em outros lugares. Pelo menos o básico temos aqui. Muitas querem copiar meu look em outros países, mas não conseguem.”
Tapete vermelho
“Para mim foi um sonho. Sempre quis ser comunicadora, gosto muito de me comunicar com as pessoas, sou uma pessoa que adora fofoca das famosas. É muito bom estar ali, porque o glamour, os looks são coisas que sempre atingiram as mulheres padrão. A mulher sempre tem que ser a mais magra, a mais bonita, a mais bem-vestida. E ter uma mulher gorda na linha de frente, falar sobre isso, sobre moda de todos os corpos é importante. E espero que acabe logo essa pandemia para a gente voltar a fazer esse tapete vermelho.” (A passagem de Mayara no tapete vermelho foi gravada em São Paulo, em 2019, e passou num dos episódios do Beleza GG, este ano).
O que falta
“Falta na indústria da moda uma modelagem mais certeira, que entenda o corpo da mulher gorda. Moda festa ainda é um pouco difícil encontrar em shopping. Eu tenho acesso porque estou no meio e tenho mais facilidade junto às marcas. Por isso, nosso trabalho nas redes sociais é tão importante, para mostrar às pessoas, principalmente de classe mais baixa, as opções que existem.”
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Regras para se vestir
“Tem muita regra que não deveria ser colocada. Coisas como isso pode e isso não pode. A gente pode vestir o que quiser. Você se veste para você e não para o outro. O outro não tem que estar incomodado com o que você usa. Ninguém tem esse direito de dizer o que o outro deve ou não vestir. Por exemplo, não é o branco que engorda, mas sim comendo um monte de fast food. Não é a peça listrada que vai também te deixar maior. Isso é uma roupa e roupa não esconde, só disfarça. Mas disfarçar é enganar a si mesmo. O melhor caminho é tentar desmitificar tudo isso que falam para a gente. Tem a questão do braço mais gordinho também, que é um tabu para muita gente. Já foi para mim, é algo que ainda me incomoda um pouquinho, mas eu não deixo meu corpo passar calor por conta desse braço. Esse tipo de exercício é algo que a gente tem que fazer todos os dias. É muito difícil. Para muita gente parece simples, mas não é. É passinho de formiguinha, tentando não trazer para a gente palavras de ódio contra o nosso corpo, só de amor, para ver se alguma hora o cérebro capta essa mensagem e comece a mudar nossa relação com a gente mesmo.”
Gorda x saúde
“Muita gente acha que por sermos gordas e temos essa profissão, fazemos apologia à pessoa ser gorda. Não é isso que acontece. A imagem que se tem é que comemos pacotes e pacotes de salgadinhos e sorvetes no sofá. Não é assim. Tem que ter uma alimentação regrada, colocando a saúde em primeiro lugar sempre. Se precisar fazer qualquer procedimento por conta da saúde, a gente vai fazer. Mas essa liberdade de poder ser quem somos e não ter vergonha disso é necessária. É preciso ficar atento à saúde como todo mundo. Fazer check-up anual, ter alimentação saudável, sair do sedentarismo. O corpo tem que estar em movimento, como qualquer pessoa.”
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Mãe solo
“Me sinto uma mulher foda, na verdade. Passei por um câncer na tireoide aos 18 anos, fui mãe aos 17, do Rafa, que hoje tem 14, e aos 23, da Sofia, que tem 8. Por mais que a gente não consiga dar conta de tudo às vezes, a gente não precisa dar conta de tudo. Ponto. Tem que parar com essa cobrança que tem que ser a mãe perfeita. As mães competem entre si, para provar quem é a melhor mãe. Acho isso tão complicado. Comecei a me desapegar dessas coisas de maternidade, porque a gente fica enlouquecida. Sou mãe solo e preciso dar conta de tudo, inclusive dos meus pais também, porque moro com eles. Às vezes, a Sofia não entrega uma lição de casa, mas acontece.”
Gordofobia
“Quando engravidei da Sofia, tinha 23 anos, estava numa fase de transição, com depressão desde que descobri que estava grávida. Estava meio aérea, mas no dia que eu fui fazer o teste da anestesia, o médico olhou para mim, falando que não ia dar para fazer a raqui, porque tinha muita gordura nas costas. Falou de uma maneira muito grosseira, como se a culpa fosse minha. Outro caso foi recente foi quando levei meu filho ao endocrinologista porque ele está um pouco acima do peso considerado pela medicina. O médico olhou para mim e falou, tem a quem puxar e já foi me indicando para fazer uma bariátrica, sendo que a consulta não era nem minha. São coisas bem constrangedoras.”
Gorda sim
“Há uma questão de tom, mais pejorativo, de xingamento. E isso me incomoda. Eu sou gorda, tenho espelho na minha casa e sei disso. Mas não acho justo você ficar se referindo à pessoa por conta de sua característica física. As pessoas têm um certo medo de falar a palavra gorda, porque muitas já se sentiram ofendidas. Também tentam minimizar, falando no diminutivo, gordinha. Ou usando outras palavras, como forte, grande. É preciso normalizar a palavra gorda como um adjetivo, como bonita, feia, alta, magra, morena, loira, careca”
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Respeito
“É preciso respeito verdadeiro não só para lacrar na internet. Pode ser que muita gente que curte minha foto zombe dela por trás do celular. Mas é preciso que esse respeito aconteça na vida real. Quando não existir mais situações de gordofobia médica, de falta de acesso, ter espaço para pessoas gordas em todos os lugares, ser possível passar pela catraca de transporte público sem constrangimento. É difícil até mesmo na hora do divertimento. Por exemplo, chegar a um bar e ter uma cadeira de plástico que não suporta seu quadril. Imagina toda vez que você sair, ter de ligar para o bar para saber se tem uma cadeira de tantos centímetros que caiba minha bunda. Cadeira de praia quebrar. São coisas que afetam a gente. Todos em volta ficam olhando e a gente fica mais constrangida ainda. Muitas pessoas têm distúrbios emocionais muito sérios em relação a isso.
Tendência
“Minha família pé de pessoas gordas, então tenho essa tendência. Mas não digo que vou sempre ser assim. Vivemos em constante mudança. Se um dia eu emagrecer, não vai ser para se encaixar em padrão nenhum, porque eu gosto de mim do jeito que eu sou. Vai acontecer porque eu quis mudar, simples assim.”
Além do plus size
“Tenho feito comerciais que vão além do universo plus size, de produtos como xampu, joias, supermercado. O mercado esta abrindo para a diversidade. Uma mulher gorda usa xampu, , escova os dentes, vai ao mercado, vai ao shopping. As pessoas gordas saem na rua, né?”